Entrevista: Umbu Podcast

out/2021

“Todos os podcasts procuram produzir seus conteúdos a partir de suas vivências e interesses. O formato de bate-papo é divertido para nós nesse momento, mas isso não significa que, no futuro, não possamos passar a fazer o Umbu de outra forma, inclusive. “                                                                                                                                                                                  

Papo Agridoce

Três amigas baianas, negras e comunicólogas. Era tanta conversa que, em outubro de 2020, resolveram compartilhar debates do cotidiano e ampliar a roda para ouvintes desconhecidos. Neste mês, celebram o primeiro ano do Umbu Podcast e Resenha Agridoce, dois projetos de comunicação que são distintos, mas se completam, no rádio e internet.

A publicitária Mirtes Santa Rosa e as jornalistas Camilla França e Val Benvindo batem um papo com a ABMP sobre o universo dos podcasts, formatos de produção de conteúdo, produtos transmídia e gig economy, sem abrir mão de refletir sobre a luta antirracista e posição da mulher negra na sociedade e veículos de imprensa, com direito a recado agridoce para o mercado publicitário local.

 

ABMP: Podcast existe há muito tempo. Mas, no Brasil, o ano do boom e popularização do formato foi só em 2020, com o Flow Podcast. Hoje, em cada esquina temos duplas, trios ou até quartetos reunidos com o objetivo de produzir conteúdo. Entretanto, é perceptível que os principais podcasts são aqueles produzidos em São Paulo. Por isso, falem um pouco sobre a importância da existência de um podcast 100% soteropolitano feito para todo o país consumir, com identidade que vai desde o sotaque ao estilo das apresentadoras.

UP: O Umbu Podcast vem, desde a sua concepção, com a proposta de replicar e reproduzir elementos das nossas rotinas e das nossas identidades, a partir de importantes referências da cultura baiana. O próprio nome do programa já traz isto, refletindo a nossa identidade cultural para além de uma abordagem temática, mas também, como uma firmação política, que reflete outros conjuntos de ideais e referências visíveis nas pautas, nas entrevistas, nas imagens. São referenciais que, de alguma forma subliminar, posicionam toda baianidade como elemento principal de um produto, sem assim precisar rotular.

 

ABMP: Como conceito, o podcast nada mais é do que um programa feito em áudio sobre um ou mais assuntos, como se fosse um debate ou uma conversa, roteirizada ou não. Só que o podcast mais informal, apenas de bate-papo no formato de entrevista, exerce um papel de protagonismo, principalmente em plataformas como YouTube e Twitch. No caso do Umbu, o conteúdo e formato são mais diversificados, pautados pelo cotidiano e bom humor. Qual a visão de vocês sobre essa espécie de monocultura? Acreditam que pode ser um risco para aqueles podcasts mais “trabalhados”, cheios de efeitos e edições?

UP: Não acreditamos em monocultura. Todos os podcasts procuram produzir seus conteúdos a partir de suas vivências e interesses. O formato de bate-papo é divertido para nós nesse momento, mas isso não significa que, no futuro, não possamos passar a fazer o Umbu de outra forma, inclusive. Todos os trabalhos e suas formas podem ser modificados a partir dos objetivos e do público a ser atingido.

 

ABMP: O Umbu Podcast e o Projeto Humanos, com o Caso Evandro, são uns dos poucos projetos do tipo que conseguiram ser transmídia de uma maneira espontânea, por popularidade. Vocês (Camilla, Mirtes e Val) estão também na Rádio Metrópole e o Projeto Humanos tem conteúdo no Globoplay. Avaliam que esse caminho pode se tornar uma tendência? De que maneira podcasts podem ser mais úteis, comercialmente falando, para emissoras de televisão, portais de notícia e rádio?

UP: Em tempos de convergência midiática e de explosão dos equipamentos tecnológicos, já podemos informar que este caminho é mais do que uma tendência. É uma realidade. Dificilmente, os produtos de comunicação e culturais sobrevivem sem interatividade com outros produtos ou redes sociais para disseminação de seus conteúdos e informações. Isto, por si só, já indica a viabilidade comercial na fusão de podcasts com outros veículos e ferramentas de comunicação.

ABMP: Na pergunta anterior, fizemos referência ao Resenha Agridoce, programa do trio do Umbu Podcast na Rádio Metrópole – exibido todas as sextas-feiras, às 20h. Quais as principais diferenças entre as plataformas rádio e podcast? Mesmo se tratando de conteúdo em áudio e vídeo, no fim das contas, feitos pelas mesmas pessoas.

UP: Então, são produtos bem distintos. Talvez de similares só tenham as apresentadoras (risos). O podcast celebra, agora em outubro, seu primeiro aninho de existência. Ele é organizado por temporadas. Inclusive, em novembro, vamos lançar a terceira e cada episódio tem um tema. Em quase todos recebemos um especialista como convidado e temos um roteiro. São programas editados e gravados com bastante antecedência, com duração de cerca de 30 minutos. Já o Umbu na Metrópole tem programas temáticos sim, mas recebe mensagens e ligações. Ou seja, temos a interação com o público. E isto, por si só, nos rende grandes surpresas, imprevistos e momentos inesquecíveis. O programa é semanal, dura 1 hora e é ao vivo.

 

ABMP: Spotify, Deezer, YouTube, Twitch e Soundcloud são algumas das plataformas que hospedam podcasts. Dadas às devidas proporções, trata-se de uma relação baseada na “gig economy”, muito comum em serviços de transporte, serviço e alimentação, por exemplo. Como é a relação do Umbu Podcast com essas gigantes da tecnologia e de que maneira vocês – produtoras de conteúdo – podem se cercar na busca por remuneração e melhor divulgação? Já que cada podcaster contribui com essas plataformas no quesito aumento de audiência.

UP: Sabemos que essas plataformas, a cada dia, buscam dificultar a divulgação para podcasts. Eles ganham dinheiro com os grandes anunciantes apesar de estarmos em suas plataformas. Acredito que a discussão seja como podemos ter remuneração desde o primeiro clique ou primeiro programa que coloquemos nessas plataformas, e que, caso isso não comece a acontecer, o caminho é, sim, criar o que se chama de cooperativismo de plataforma para o nosso mercado local, inclusive, visando alcançar os anunciantes de nosso estado. Sempre nos perguntamos a razão das agências de comunicação preferirem apresentar para seus clientes para produtos nacionais e não os locais.

Não temos nenhuma ilusão de achar que a remuneração do Umbu Podcast será a mesma que de um podcast que já nasce sendo patrocinado pela própria plataforma de streaming. Nosso objetivo é que os que buscam novas soluções para seus anunciantes entendam que produzimos conteúdo de qualidade, bem agridoce e que o nosso alcance local é muito mais interessante para o patrocinador.

 

ABMP: Três mulheres, negras e do Nordeste, com três ou mais microfones abertos para transmitir mensagens, de motivação, conscientização, reflexão, ou até mesmo provocação, dependendo do tema. Isso para milhares de pessoas, que estão ali na live ou nos VoDs. Qual a importância desses espaços para a formação das pessoas e responsabilidade quanto a qualidade de informação e não disseminação de fake news?

UP: Somos a resistência desse país, e para nós, transmitir mensagens, motivar não é novidade. Há 20 anos, estudar publicidade e falar sobre negritude na publicidade parecia um bicho papão e era assunto que não devia ser tratado. Falar sobre semiótica antirracista nos programas policialescos era loucura. A comunicação no Brasil sempre viveu da aparência e do conceito de democracia racial, e sabemos que, ainda hoje, isso não existe. Além disso, a luta e discussão sobre esses assuntos é diária. Basta observar com olhos mais críticos que a programação das rádios e TVs abertas, que continuam com seus apresentadores brancos e valorizando as mesmas questões de sermos iguais nesse país. Assim, eles se utilizam do discurso que os anunciantes buscam esse “formato” e estereótipos. A mudança acontece quando passamos a nos impor como pessoas pensantes, que produzem comunicação com qualidade, e que entendemos que nosso conteúdo será escutado e reproduzido por quem se interessa por nossas conversas.

Ao mesmo tempo, sabemos que muitas vieram antes de nós, e que nós seremos a inspiração de outras mulheres negras, pois sabemos e valorizamos todos e todas que resistiram e permaneceram antes de nós. Acreditamos muito em ancestralidade e em toda essa energia. Quanto à questão de fake news, já imaginou se não tivéssemos esse cuidado? Sempre foram o povo negro e os indígenas quem mais sofreram por notícias falsas desde que o mundo é mundo, ou o entendimento de que somos feias ou mesmo menos inteligentes não foi um grande projeto de fake news de nossa sociedade?

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