A nova rotina das mulheres acende um alerta amarelo
Estamos no Setembro Amarelo. Tempo em que a sociedade brasileira se articula para promover e se engajar em uma série de ações que visam prevenir o suicídio em todo o país. O tema que é urgente e está intimamente relacionado a questões que envolvem a saúde mental, precisa ser debatido em múltiplos espaços, sob os mais diferentes vieses. Este foi o motivo que me encorajou a aproximar o assunto do meu lugar de fala para tratar de uma questão séria que há anos vem afligindo as mulheres e se complexificou ainda mais durante a pandemia: a jornada contínua de trabalho. Sim, você leu certo. Não se trata mais de dupla jornada e nem de tripla jornada e sim de jornada continua de trabalho.
De forma geral, a maior parte dos grupos sociais reconhece a sobrecarga laboral enfrentada por mulheres que precisam atuar no mercado e ainda desempenhar ações que envolvem o cuidado com crianças, idosos, doentes e com a rotina familiar. Um trabalho exaustivo que não é percebido e nem valorizado por uma sociedade que se estruturou nas bases machistas e patriarcais. Estudos indicam que essas atividades invisíveis geram uma sobrecarga que pode variar entre 7h a 10h semanais se comparadas a jornada exercida por homens. Como consequência deste estresse ocupacional, as mulheres recebem salários menores, sofrem pressão por ter que comprovar frequentemente a sua capacidade e têm tido, ao longo da história, muito menos oportunidades de alcançarem cargos de liderança mesmo sendo parte da população que mais investe em educação e que também costuma ter o melhor desempenho. A problemática supera questões de ordem prática e invade o campo subjetivo exercendo forte carga mental, um sentimento de frustração e incapacidade, fadiga, baixa autoestima que, invariavelmente, se desdobram em doenças mentais nos mais diversos níveis.
O que já estava ruim ficou ainda pior durante a pandemia do coronavírus devido ao surgimento de dois novos fatores: a impossibilidade das crianças irem a escola (uma grande proporção ainda não retornou) e a redução da rede de apoio. Tarefas que outrora eram compartilhadas e executadas por outras pessoas passou a gerar mais responsabilidades, necessidade de adequação, sobrecarga e estresse. Durante esse tempo de isolamento quantas mulheres você ouviu relatar que passou ou passaria o final de semana fazendo faxina, organizando a casa ou as coisas que não puderam ser feitas ao longo da semana? Cientistas indicam por isso a existência de um fenômeno que vem sendo chamado de jornada continua de trabalho. Mulheres que só param de trabalhar enquanto dormem. Isso vem acontecendo no mundo inteiro e ganha contornos ainda mais dramáticos quando envolve o cotidiano de mulheres negras e de grupos vulnerabilizados e violência doméstica. Essa é uma discussão urgente que não pode ser rotulada como mimimi, pauta de apenas um grupo social ou de partidos políticos. Não pode haver espaço na sociedade para que a jornada contínua de trabalho seja considerada o novo normal. Um mundo melhor como a que sonhamos precisa ter forças integradas atuando em equilíbrio. Só assim poderemos ter um setembro florido e tempos mais coloridos para todos.
Artigo originalmente publicado no Bahia Notícias em 09 de Setembro de 2020
_______________
O conteúdo e opinião publicados neste artigo são de inteira responsabilidade do autor ou autora.

Alessandra Calheira
Colunista
Atuou como criativa e redatora publicitária quando foi laureada com um Leão no Festival Internacional de Cannes, com uma medalha no Clube de Criação de São Paulo, Top de Marketing da ADVB, entre outros.
SEPARAÇÃO não é um BICHO PAPÃO (não deveria ser)
A lei do divórcio (6.515/1977), sancionada em 26 de dezembro de 1977, foi responsável por mudanças profundas na sociedade brasileira. Antes dela, o casamento era pautado pelo vínculo indissolúvel, e, por isso, muitas pessoas se mantinham juntas, mesmo quando...
Por um letramento histórico e racial na propaganda
Adoro passear na cidade e observar as propagandas que estão em todos os lugares. Dos outdoors duplos e triplos que visam impactar de forma estratégica seu público-alvo, aos cartazes de quando andamos nas ruas em pequenos centros comerciais. Gosto de observar o que as...
Comporte-se e liberte-se!
São muitas variáveis que percorrem o entorno dos consumidores e, quando se trata de entender seu comportamento, testar opções pode ser mais adequado considerando um ambiente em constantes mudanças. Além das análises tradicionais que, atualmente, muitos softwares de...
Se o seu algoritmo é branco, a culpa é sua
Em setembro deste ano assisti a uma palestra da atriz e apresentadora Regina Casé, direcionada para uma turma de artistas, criativos, formadores de opinião e empresários de todo o país. Entre ponderações, risadas e provocações, uma fala me atiçou à reflexão: não cabe...
Se a sua marca não tem um propósito, está na hora de ter
Chegamos ao ponto de virada. Segundo Antonio Guterres (Secretário Geral da ONU) nós entramos na era da “ebulição global”, ou seja, deixamos o estágio de “aquecimento global” – há predições sobre 2023 ser o ano mais quente em centenas de anos. Além disso, alguns...
2024 | o ano das (re) descobertas
Ei! Se apresse! Você está preparado para 2024? O futuro está cada vez mais próximo e é importante estarmos preparados para as mudanças que estão por vir. O ano de 2024 promete ser um marco em diversos aspectos, desde avanços tecnológicos até transformações sociais e...
junte-se ao mercado