O faniquito deles não é sofrença nossa

fev/2017

 

Já é Carnaval Bahia! Me dou ao luxo de iniciar este artigo com a mais banal das frases que eu e você conhecemos sobre nossa festa, um lugar comum que logo será ratificado pelas redes sociais com milhares de baianos postando no Facebook e no Instagram a dita própria, e não é falta de criatividade, é chavão mesmo. E chavão não se discute. Mas, se você é mais criativo que os outros, então ignore e poste esta outra, tão original quanto: Já é Carnaval Cidade!

O Carnaval de 2017 promete ser, ouvi dizer na mídia, meu Deus do céu, um dos mais pobres e desanimados carnavais de todos os tempos, apenas por que três, ou quatro, marcas de grandes blocos não estarão desfilando na Avenida. Que sejam cinco, ou seis. Desde que me entendo como carnavalesco anônimo este é um fato mais do que corriqueiro, blocos aparecem e outros desaparecem. E sempre tem alguém apelando para a mídia na suposição de que esta exerça algum tipo de pressão sobre o poder público que, então, muito “sensibilizado” abriria os seus cofres para subsidiar o bloco. As vezes dá certa, as vezes não.

O curioso nesse faniquito midiático é que essas agremiações que ameaçam não desfilar imaginam que o povo, confirmada a sua ausência na Avenida, vai se desesperar e arrancar os cabelos e dar um chilique em plena rua e estrebuchar no chão só por que elas não estarão na Barra, ou no Campo Grande, como se o baiano tivesse alguma preferência por bloco. Foi-se esse tempo da fidelidade da marca, eles próprios os blocos de trio incentivaram o folião a pular a cerca: compre um pacote que você brinca cada dia num bloco diferente.

E é claro que o folião ficou cada vez mais e mais distante. Sem fidelizar não há amor que resista e me parece que neste caso cabe como uma luva uma frase que li outro dia na internet: “Namoro à distância é igual ao olho do boi, quanto mais longe fica do rabo, mais perto está do chifre”.

Infidelidades aparte, o folião baiano e mesmo o turista está se lixando para o fato deste, ou aquele bloco, não desfilar, por mais famoso que seja, ou, pareça ser. O folião quer uma cervejinha gelada, boa companhia, encontrar os amigos, dançar e beijar…. ele quer se divertir e nessa pegada não cabe sofrença.

Não sou nenhum profeta, mas tenho certeza que quando o Carnaval passar pela quarta-feira de cinzas, a mesma mídia, que já vaticina em dramático apelo um Carnaval pífio, estará exaltando a festa e dirá e escreverá em espetaculosas manchetes que foi “o melhor Carnaval de todos tempos”. No meu livro sobre a História do Carnaval da Bahia atentei para essa particularidade nossa, traço cultural. É o tipo de manchete e escalada que se repete todo ano. E não é falta de criatividade. É chavão mesmo.

 

Nelson Cadena

Nelson Cadena

Colunista

Escritor, jornalista e publicitário.

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