Lentes da inclusão: compromisso real ou apenas mais um filtro de mercado?
A fotografia tem um papel fundamental na construção social, funcionando como um meio de representar, interpretar e influenciar a realidade e a identidade coletiva. Ao registrar momentos, pessoas, lugares e eventos, a fotografia não apenas preserva memórias, mas também molda a forma como a sociedade se vê e compreende o mundo.
Ao longo dos anos, a engenharia fotográfica passou por transformações significativas, evoluindo de processos químicos complexos e cáusticos para a era digital, com tecnologias mais práticas e eficientes, incluindo o armazenamento na nuvem. Nesse contexto de avanços, a Kodak, fundada em 1888, destacou-se ao popularizar a fotografia, levando câmeras e filmes ao alcance do consumidor médio. A empresa tornou-se a maior do setor, mas, temendo que a fotografia digital pudesse comprometer seu produto principal, evitou o investimento, o que resultou em sua falência em 2012.
Apesar de sua hesitação em abraçar o digital, a trajetória da Kodak é marcada por inovações transformadoras, impulsionadas por mentes criativas. Nos anos 1970, a empresa alcançou uma receita anual de US$ 4 bilhões (cerca de US$ 50 bilhões hoje). No entanto, essa história de avanços esconde um lado controverso: câmeras e filmes foram calibrados para favorecer tons de pele mais claros, estabelecendo um padrão técnico que excluía pessoas negras e revelando como a tecnologia pode refletir, intencionalmente ou não, os preconceitos da sociedade.
O famoso cartão “Shirley”, usado para calibrar tons de pele, trazia uma mulher branca de cabelos ruivos como referência, não necessariamente por uma escolha racista consciente, mas evidenciando que o tom caucasiano era considerado o padrão. Esse critério técnico, ao definir para quem essas câmeras eram “idealmente” feitas, deixava claro quem não era a prioridade.
Inaceitável em qualquer época, essa prática levou fotógrafos e profissionais de cinema a promover boicotes à Kodak. Em resposta às demandas por ferramentas de imagem mais inclusivas, empresas começaram a corrigir os vieses raciais profundamente enraizados na fotografia digital, um passo crucial para a representação justa de pessoas negras. Esses ajustes buscam não apenas remediar um legado de exclusão que persiste desde a era analógica, mas também enfrentar preconceitos que se reproduzem nas IAs, que ainda falham em reconhecer a diversidade de tons de pele de forma precisa.
Diante de um histórico tão excludente, surge a pergunta: até que ponto as empresas realmente buscam uma inclusão autêntica, ou apenas uma reparação forçada para corrigir erros do passado? Afinal, em uma era que celebra a diversidade, a tecnologia estará mesmo comprometida em refletir toda a sociedade, ou a inclusão será apenas um filtro para atender às demandas do mercado?
_______________
O conteúdo e opinião publicados neste artigo são de inteira responsabilidade do autor ou autora.

Rodrigo Almeida
Colunista
Relações Públicas, Mestre em Gestão e Tecnologia Industrial, Professor Universitário e Diretor da agência CRIATIVOS.
Autenticidade é Rei: Construindo Relações Verdadeiras em Tempos de IAe Algoritmos
Recentemente, ouvi do meu terapeuta que, em um mundo cada vez mais dominado pela tecnologia, onde algoritmos moldam nossas interações e decisões, a autenticidade se destaca como uma qualidade inestimável. Neste cenário, a relação entre o indivíduo e as marcas torna-se...
Além do Cargo
Em um ambiente corporativo, muitas vezes nos deparamos com a tendência de rotular as pessoas com base em seus cargos e funções. Contudo, essa visão pode ser extremamente limitada e prejudicial tanto para o desenvolvimento individual quanto para a dinâmica da equipe. A...
Legado da Diversidade: A Transformação Pessoal Além das Empresas
A era da diversidade e inclusão nas empresas, que ganhou destaque nas últimas décadas, trouxe mudanças significativas na forma como as organizações operam e enxergam seus colaboradores. No entanto, há quem acredite que essa fase esteja chegando ao fim, levantando...
O Real Valor de Saber e Ter um Propósito: Uma Reflexão Provocadora
Em tempos em que a superficialidade parece dominar nossas interações e decisões, surge uma pergunta inquietante: o que realmente significa ter um propósito? A vida moderna, repleta de distrações e aparências, muitas vezes nos leva a correr atrás de objetivos que, no...
Geração Z e o Movimento Feed Zero: Autenticidade e Saúde Mental na Era Digital
A Geração Z, composta por pessoas nascidas entre o final da década de 1990 e o início de 2010, está moldando a forma como nos relacionamos com o mundo digital. Uma das características mais marcantes dessa geração é a familiaridade com a tecnologia: enquanto os...
O Casulo Digital: Como o Celular Nos Afasta de Nossa Essência
Vivemos em uma era em que, paradoxalmente, a conexão digital nos desconecta de nossa essência. Cada vez mais, nos vemos presos a um "casulo" invisível, representado pelo nosso celular, que nos isola da realidade ao nosso redor. Em vez de usarmos a tecnologia como uma...
junte-se ao mercado