Nem todo passo precisa de plateia
“Num mundo realmente invertido, o verdadeiro é um momento do falso.”
— Guy Debord
Vivemos em uma era onde a exposição é regra e o silêncio, quase um pecado. Em um cenário assim, a diferença entre comunicar-se e promover-se parece, muitas vezes, diluída. Mas ela existe — e talvez seja justamente nesse espaço, sutil e profundo, que mora a verdadeira força de uma marca, de uma trajetória, de uma história profissional.
Não é difícil perceber: quanto mais nos acostumamos à lógica da performance, mais passamos a medir valor pelo volume de presença. Quantos posts por semana? Quantos cases exibidos? Quantas conquistas anunciadas? Há uma inquietação permanente em estar visível, em marcar território, em reforçar, todos os dias, quem somos ou o que fazemos. Mas o que sobra dessa imagem quando tiramos a moldura?
Autopromoção é o esforço quase compulsivo de reafirmar a própria relevância. É falar de si o tempo todo, como se a ausência de aplausos fosse sinônimo de fracasso. É transformar cada ação, cada pequena conquista, em um espetáculo. Não há pausa, não há respiro, não há espaço para dúvida — porque a dúvida ameaça a narrativa perfeita que se tenta construir.
Mas posicionamento é outra coisa. É mais paciente, mais silencioso, mais sólido. Ele nasce do entendimento claro de onde se está e para onde se quer ir. Não precisa ser gritado. Não exige holofotes constantes. Ele se sustenta na coerência entre discurso e prática, na entrega que confirma o que foi dito, no respeito pelo tempo das coisas.
Enquanto a autopromoção depende da frequência do discurso, o posicionamento se apoia na consistência da entrega. Um é esforço de insistência; o outro, construção de confiança.
Não se trata de condenar a autopromoção. É legítimo querer ser visto. É necessário comunicar-se. O problema começa quando a comunicação deixa de ser ponte e passa a ser vitrine. Quando a preocupação em mostrar é maior do que a atenção em construir. Quando a ansiedade de aparecer ocupa o lugar da reflexão sobre o que, de fato, precisa ser dito.
Existe um vazio particular nesse tipo de exposição incessante. Um vazio que, muitas vezes, a própria pessoa não percebe. O excesso de presença pode ser também um sintoma de insegurança. Um medo de que, se não estiver ali, se não falar sobre si mesmo, será esquecido. Mas a memória não se alimenta apenas de presença. Ela se nutre de impacto. De experiências reais. De significados.
Há uma diferença essencial entre ser lembrado porque gritou mais alto e ser lembrado porque deixou algo de valor. E talvez seja esse o convite mais necessário nos dias de hoje: refletir sobre o que permanece quando os stories desaparecem, quando os posts descem no feed, quando a cortina do palco se fecha.
Os melhores posicionamentos que conheci até hoje foram feitos de mais escuta do que fala. De mais curiosidade do que certeza. De mais entrega do que anúncio. Foram construídos sem pressa, com espaço para revisões, para pausas, para silêncios.
É tentador confundir barulho com relevância. Mas o tempo, sempre ele, costuma ser um bom filtro. O tempo revela o que é sólido e o que era só espuma.
Não é sobre falar menos. É sobre falar melhor. É sobre perguntar antes de afirmar. É sobre entender que nem todo passo precisa de testemunha, que nem toda conquista precisa de placa de inauguração.
E que, muitas vezes, é no silêncio que o valor se torna mais audível.
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O conteúdo e opinião publicados neste artigo são de inteira responsabilidade do autor ou autora.

Emanuel Bizerra
Colunista
Comunicólogo e ecologista, especialista em consumo, marcas e comunicação. Observador da vida cotidiana e amante da natureza, escrevo quando pede o coração.
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