Você pode desistir quando quiser.
Repita comigo: você não tem compromisso com o acerto! Seu compromisso é com você!
Já pensaram o quanto quem desiste, primeiro é julgado, pra depois, reconhecido?
Geralmente, quem desiste, desiste de algo, em que tem sempre outro alguém envolvido. E, em nossa sociedade, o habitual é esse alguém envolvido ocupar a posição de vítima da desistência do outro, que decidiu, e, automaticamente, virou algoz.
No meu trabalho como psicoterapeuta, costumo ser aquela profissional que convida quem desistiu da relação pra ser ouvido. A maioria das vezes convenço quem me procura, sofrendo por uma separação recente, a me deixar entrar em contato com seu/sua ex e chamá-lo para um encontro comigo, pra que eu possa ajudar, da melhor forma, na elaboração desse término. Então, imaginem vocês, que lugar ocupa essa pessoa que resolve dar ouvidos a este, que desistiu? Como assim, você vai dar voz àquele que ‘abandonou a embarcação’?
É uma posição muito solitária a de quem assume a decisão de se retirar! É como se fosse preciso a autorização das partes para sair do lugar, ou da situação, que lhe causa angústia. E a intenção, aqui, é fazer você refletir o quanto de sustentação interna é necessária por parte daquele que se posiciona primeiro.
Movidos pela empatia e por compaixão a quem escutou a decisão, todos os envolvidos, geralmente, se movem na direção de dar colo a quem fica… sem conseguir mensurar os recursos emocionais que, possivelmente, foram convidados a serem movidos por quem assumiu o desafio de interromper um fluxo que já não se apresentava saudável, mas que ninguém queria mexer nisso.
Essa pessoa é chamada de corajosa por alguns, mas, pela grande maioria, contaminada pelas dores de outras situações pessoais quanto a este tema, é comumente rotulada como alguém frio, frouxo ou que preferiu fugir.
Por que será que ainda é novidade pensar que essa desistência também significa que essa pessoa teve a hombridade de encerrar um caminho, quando já não se sentia mais nele? Algum leitor, aqui, por acaso, se sentiria melhor caso soubesse que está mantendo uma relação com alguém que não tem mais interesse em permanecer?
Quantas vezes você deixou de desistir de algo, por medo do que a outra pessoa iria pensar sobre você? E você justificou pra si mesmo que era uma questão de responsabilidade com o próximo, como se aquele que está com você, vivendo algo, se, por acaso, desistir, estará te oferecendo um atestado de falta de responsabilidade afetiva!
Acho que está na hora de você compreender que a responsabilidade afetiva envolve, também, a autorresponsabilidade afetiva, que é o que garante a sustentação para saber lidar com a responsabilidade sobre qualquer vínculo, afinal, aonde poderá parar uma relação em que você próprio se perdeu de você?
Atenção! Você é a ÚNICA pessoa que precisa compreender, de fato, os motivos do porquê você está desistindo, então, cuidado com a insistência das explicações, diante da sua expectativa em sair com uma boa imagem. Às vezes, a vida sinaliza e conduz novos rumos, e, por pior que seja o ônus de ser julgado, é importante poder assumir escolhas que te representam, e que, nem sempre, serão compreensíveis por quem está emocionalmente envolvido com você, e se sente traído pelas suas decisões. Mas, nesse processo, não esqueça de acolher a si mesmo e ao outro, mesmo que a decisão seja em sua direção.
Então, nem sempre vale a pena entrar no mérito real das explicações do porquê a dissolução da relação, se antes você já se esforçou em ir dialogando e negociando pontos de suas insatisfações, que não foram acolhidos e levados à sério como estímulos para mudanças.
Muitas vezes, é a partir de um choque que muitas pessoas começam a desenvolver sustentação interna. Para além do susto, das mágoas, sensação de abandono e, por que não dizer, sentimentos de raiva e decepção, ocorre também um despertar de mudança, fortalecimento e respeito consigo mesmo, que só uma situação dessa é capaz de mover. E não há quem não desenvolva orgulho de si quando começar a promover o auto-respeito que invejou de você, naquele momento profundo de dor.
Nessas horas, cabe, respeitosamente, cada um sustentar o que reverbera do processo do outro, em si. Daquele que decidiu por 2; daquele que recebeu o veredito; do lugar que você será colocado e da posição que você vai escolher ocupar, diante disso.
Então, que a sua ética te sustente! Afinal… tomar atitude de desistir é um grande desafio…muitas vezes, solitário.
(Dedico esse texto a todos aqueles que compreenderam que desistir é um atributo da vida adulta. Se você desistiu do seu casamento; do seu emprego; da sociedade com seu sócio; da sua carreira; do lugar que a sua família reservou pra você ocupar… tome posse, com responsabilidade e consciência, sem querer controlar o que vão dizer de você. Às vezes, você vai sair como louco, e, outras vezes, como tudo que o outro também queria ser… mas ainda não consegue compreender… até o tempo passar, e todo mundo agradecer!)
Muitos textos sobre as dores de quem fica… pouquíssimos sobre quem desiste! Entre amores e dores… todos seguem… e aprendem muito com isso, já que a vida é feita de ciclos!
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O conteúdo e opinião publicados neste artigo são de inteira responsabilidade do autor ou autora.
Sinara Dantas Neves
Colunista
@acuradoraferida
Doutora e pós doutoranda em Família na Sociedade Contemporânea (UCSaL-BR/ ICS- Universidade de Lisboa – PT);
Mestre em Psicologia (USP); Psicoterapeuta sistêmica (ABRATEF 206-BA); Professora universitária há 23 anos;
Pesquisadora da Conjugalidade; Escritora; Palestrante;
Mãe, amante da sua profissão e apaixonada por gente!
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