A cidade de Oxum se prepara para o Scream – Salvador Creativity and Media Festival 2019
Vem aí o Scream, o esperado Festival de Criatividade que vai acontecer em Salvador no próximo mês de dezembro, organizado pela nossa ABMP. Boas-vindas aos visitantes e palmas para os organizadores. O folder do evento alerta bonito que “a criatividade é a ferramenta do futuro. E o futuro bate à nossa porta todos os dias de todas as maneiras possíveis. O que é preciso fazer para acompanhá-lo? Ser criativo.”
Criatividade e inovação tem em comum a inteligência. Tradicionalmente, a inteligência é uma capacidade mental genérica que implica na habilidade de raciocinar, planejar, resolver problemas, pensar de forma abstrata, compreender ideais complexas, aprender com rapidez e aprender da própria experiência. O dicionário Aurélio enfatiza a capacidade de compreensão. Darwinistas sempre a relacionaram à capacidade de adaptação ao meio. Na etimologia, é a sutil capacidade de ler nas entrelinhas, inter legere.
Consideremos a criatividade como um ponto de partida, uma fagulha propulsora do novo. Precisamente por isso, ela é fugaz e instantânea, carece de lastro e estrutura, de teimosia e persistência para transformar potência em negócio, ideia brilhante em tecnologia e, resumo da ópera, processo criativo em nota fiscal.
Consultei a pesquisa de Howard Gardner, o psicólogo americano que criou a Teoria das Inteligências Múltiplas. O cientista se debruçou sobre esta ideia ao longo de 20 anos, graças à retaguarda de uma universidade de Boston, estruturou sua descoberta e destronou o quociente de inteligência, o famoso QI, até então o padrão mais aceito para a avaliação de inteligência. O QI media, basicamente, a capacidade de dominar o raciocínio que hoje se conhece como lógico-matemático.
A inteligência lógica matemática nos potencializa a pensar de maneira lógica, indutiva ou dedutiva, reconhecer padrões numéricos, ordenar fatos, relacionar causa e efeitos, lidar com quantidades. O desafio de promover abstrações com os números, realizar operações e lidar com objetos e conjuntos. De acordo com os rankings internacionais de avaliação de estudantes, nossa educação é extremamente deficiente na promoção dessa competência. É possível inovar sem esta base reforçada?
A segunda inteligência, a verbal ou comunicativo-linguística está ligada ao processamento da linguagem, à expressividade verbal e não precisamos ir longe para nos lembrarmos dos repentistas e rappers, com seu emprego mágico de palavras e termos, na capacidade de ler, decodificar e escrever. E, sobretudo, se comunicar, por meios de discursos e da escrita.
Gardner se refere enfaticamente à inteligência musical e nesse quesito nossa cidade é campeã com sua produção de sons, ritmos e harmonia. Talvez seja o exemplo mais claro entre nós do encontro da criatividade musical e coreográfica com a inovação em termos de lastro e estrutura gerencial que gerou o carnaval de Salvador. Perceber, executar e se sensibilizar com a música é um traço fantástico e criativo de nossa inteligência local. A orquestra Neogibá é um exemplo de inovação que tangibiliza valor e opera mudanças na vida de centenas de crianças.
Gardner reconhece também a inteligência espacial, traço de pessoas com facilidade para perceber imagens, lidar com espaço e direção, interpretar o terreno. Visão de perspectiva, senso de proporção e tridimensionalidade.
O psicólogo considera como a inteligência corporal-cinestésica tudo aquilo que uma dançarina do Ilê Aiê faz e capoeiristas executam. Jogo de cintura, molejo, ginga, suingue são nomes que damos à opulência de gestos corporais que contém eloquência, controle do corpo, destreza, em resumo, expressividade. Antigamente, seriam reprovados nos cânones do QI.
Finalmente, ele identifica duas inteligências relacionais: a interpessoal e a intrapessoal. Em linguagem de hoje, a interpessoal é o talento para fazer redes, compartilhar, envolve empatia e facilidade para lidar com pessoas e com relações sociais. A segunda, a intrapessoal, envolve a capacidade de examinar e entender os próprios sentimentos. É uma inteligência imprescindível para a personalidade criativa que precisa exercitar a introspeção e desenvolver a intuição.
Salvador, cidade cenário do Scream, é criativa e mistura as diversas inteligências. Criatividade aqui existe de montão, nosso problema é a inovação. Temos carisma, borogodó, habitamos um ambiente geneticamente criativo, diverso e que transborda inventividade por conta de nossas raízes plurais. Mas a inovação requer múltiplas inteligência turbinadas. Enquanto a criatividade é um raio de luz que nos arrebata, a inovação exige empenho, disciplina, esforço e persistência.
Que venha o Scream ativar as múltiplas inteligências na cidade de Oxum!

Carlos Linhares
Colunista
Não aperte a minha mente: saúde mental em tempo de urgência
O tempo está passando muito veloz, a velocidade é o novo valor, virou uma commodity, a regra do quanto mais rápido melhor se consolidou. Não apenas comemos fast food, como também escutamos música e recados no WhatsApp de forma acelerada. E há quem assista filmes em...
Economia da Atenção: como o universo das telas deteriora nossa saúde mental
Repare que a dama do meme que ilustra este texto mal consegue sustentar os coraçõezinhos vermelhos. A Deusa dos likes e das curtidas expressa contentamento e ar de triunfo, afinal recebeu o reconhecimento esperado e capturou a atenção de quem a curtiu. Ela não faz...
Os saveiros e a aceleração social do tempo
Um dos produtos mais misteriosos que os mestres de saveiros transportavam nos barcos ancorados no Porto da Barra de minha infância era o Tempo. Traziam todo tipo de mercadoria para abastecer a feira livre do bairro, vindos das mais longínquas praias, muito além da...
Pensamento crítico e inteligência artificial
Era o Reino das Matemáticas, no curso de Tecnologia da Informação. Foram vários semestres ao longo de quatro anos, diferentes turmas, mas em cada uma fui recebido com um misto de cordialidade e desconfiança. Temiam que a disciplina de Psicologia fosse perda de tempo...
Inteligência Artificial e Ética: como retornar os dinossauros ao Jurassic Park?
No primeiro filme da série Jurassic Park (Steven Spielberg, 1993) três cientistas – dois paleontólogos e um matemático – recebem autorização para visitar a ilha secreta de Nublar onde se desenvolvia um experimento de segurança máxima, sob controle do Governo...
A solidão é fera, a solidão devora
...é a amiga das horas, prima-irmã do tempo, faz nossos relógios caminharem lentos, causando um descompasso em nossos corações. Não tem IA nem Chat GPT que consigam criar versos tão precisos para expressar a dor da solidão como estes do poeta Alceu Valença, salve! Há...
junte-se ao mercado