ESG e IMPACT WASHING: qual é e para quem vai o seu impacto?
Nos últimos anos, especialmente após a pandemia causada pelo novo coronavírus, surgiu também um crescente destaque a temas relacionados a uma nova lógica de produção, consumo e posicionamento. Novos termos passaram a fazer parte do nosso dia a dia, a exemplo da famosa sigla ESG e de expressões como “negócios de impacto” e “desenvolvimento sustentável” Entretanto, mais do que nunca, é importante irmos além de discursos superficiais para nos perguntarmos, com honestidade, o que tudo isso realmente quer dizer.
É curioso pensar, por exemplo, onde estão as empresas que tem práticas não admiráveis ou onde se escondem as pessoas que não estão comprometidas com um mundo melhor – afinal, ultimamente todo mundo tem aparentado ser um aliado ferrenho dessas causas. Mas não é na aparência que as transformações socioambientais ocorrem. Uma atuação sólida é feita de evidências, de dados, de indicadores e números. Já não basta dizer que é, é preciso ter provas, coerência e verdade. Do contrário, acabamos caindo no conto do “IMPACT WASHING”, uma expressão em inglês usada para empresas e organizações que se promovem a partir de um discurso vazio sobre impacto positivo e ESG, o qual não vem acompanhado de transformações reais nesse sentido. Aliás, o termo “Washing” hoje já não se limita à ecologia e ao impacto, avançando para outros terrenos como a diversidade. No entanto, a população consumidora, em especial a geração Z, sabe que a prática é o que legitima seus valores e suas crenças.
O caminho para não cair nessa cilada possui mais perguntas do que respostas. É importante se questionar: O que é impacto de fato? Quem está sendo impactado e de que forma? Qual legado estamos deixando enquanto pessoas, governos, empresas e projetos? Abraçar esses questionamentos requer o entendimento de que jamais poderemos respondê-los sozinhos, mas esse é um erro ainda muito comum. Para entender qual impacto eu quero deixar sobre o mundo e, principalmente, sobre as pessoas, primeiramente eu preciso saber quais são as suas demandas reais. Isso é determinante para que qualquer iniciativa proposta possua relevância, engajamento e horizontalidade. Para isso, é preciso quebrar um padrão colonialista de soluções prontas e fáceis pensadas para realidades que não vivemos, mas que pensamos conhecer. Não é esse o processo que acreditamos ser saudável se entendemos que a agenda ESG deve ser uma nova forma de gestão, e não uma mera reprodução do que já vem sendo praticado sob a maquiagem de um nome bonito.
Para que negócios e projetos sociais gerem, de fato, impacto positivo e mexam com as estruturas dominantes já conhecidas, é preciso quebrar a lógica de poder que está por trás das tomadas de decisão. É preciso perceber o impacto como algo transversal e não apenas localizado numa ação pontual. Do contrário, estaremos copiando e colando os mesmos modelos em que um mesmo grupo de pessoas possui a caneta para decidir sobre a vida alheia, mantendo antigos padrões de segregação, sobretudo a partir de recortes raciais e de gênero.
Se levada a sério, a ascensão das temáticas de impacto e ESG são uma oportunidade para reescrevermos essas narrativas, dando espaço para um protagonismo coletivo dentro de uma lógica de cooperação em que todos podem ganhar. Para isso, portanto, precisamos fazer as perguntas certas. Embora nos gerem desconforto, porque tocam em feridas egóicas do privilégio, também nos possibilitam um novo ponto de partida mais real e mais justo com todas as partes interessadas, não fazendo delas meros coadjuvantes – afinal, só é bom mesmo quando for bom para todo mundo. As respostas para essas perguntas não são óbvias ou fáceis, mas são um convite: vamos juntos porque essa é a única forma de ir.
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Leana Mattei
Colunista
Leana Mattei é mestra em Desenvolvimento e Gestão Social pela UFBA, tem MBA em pela UNIFACS, é graduada em Comunicação e Relações Públicas pela UNEB, tem certificação internacional em GRI e PMD PRO. Trabalha com temas relacionados à responsabilidade social e à sustentabilidade há mais de 20 anos. Atualmente, é diretora da AGANJU, uma consultoria especializada em ESG e Impacto Social e consultora estratégica de marketing da Impacto da Incentiv.me, uma startup que transforma impostos em impactos sociais positivos.
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