Foresight: como será o amanhã?
Prever o futuro já foi propriedade de profetas, gurus, bruxos, oráculos, xamãs e magos e argumento de ficção científica. Imperadores e reis antigamente dispunham de astrólogos residentes nos palácios dispostos a interpretar sinais do devir e ajudar aos monarcas nas tomadas de decisão. É comum ver ainda hoje em dia anúncios de cartomantes prometendo dizer o que vem pela frente. E como tem freguesia.
Outro tipo de clientela, mais exigente e cética, também quer saber o futuro, quer prospectar cenários a partir de outros métodos. As demandas por prospecção vem da economia, do mercado financeiro, do mundo da indústria 4.0, da propaganda e marketing, dos profissionais da saúde e da educação, do agrobusiness, do mundo da moda, etc. O que dizer do mundo do trabalho e do emprego, dos Recursos Humanos onde a cultura digital e as tecnologias disruptivas – robótica, a inteligência artificial, a internet das coisas, etc. – promoveram o desaparecimento de ocupações, o fim de profissões e empregos?
Alunos de Sistemas de Informação me instigaram a debater o futuro nas aulas de Psicologia do Trabalho. Eles me fizeram debruçar sobre este tema e a me informar sobre o imenso impacto da cultura digital e da inteligência artificial e seus recorrentes desdobramentos.
O fluxo de transformações acontece em ritmo exponencial e com uma aceleração embutida nos aparelhos que distorce o tempo de uso e volatiliza os processos. A aceleração exponencial acarreta a sensação de obsolescência e de deja vú. Altera a forma de pensar, que já não pode ser linear e local. É preciso ultrapassar o raciocínio ancestral e seu mindset onde consta que próximos anos serão lineares. A era em que vivemos é completamente diferente, em todos os aspectos e não sabemos ao certo do que vem pela frente.
Outro dia li que “um copo d’água e a senha do wifi não se negam a ninguém”. O ditado acrescentou outro modo de aplacar a sede. O wifi mata a sede de conectividade. Já vivemos fundidos à tecnologia via smartphones e gadgets, imersos nos fluxos de dados, compartilhamos do empoderamento tecnológico com máquinas nutridas por nossa inteligência, cada vez mais ameaçadoramente inteligentes. Já nos tornamos humanos híbridos com a big data, a integração de sistemas, a internet das coisas, a realidade virtual, os robôs autônomos, a segurança cibernética, o cibridismo, a impressão 3D, etc., sem mencionar a compulsão à Santíssima Trindade das Mídias Sociais – Insta, Face e Twitter – que nos abduzem muito mais do que antigos discos voadores.
Brincando com versos de Raul Seixas, a metamorfose ambulante hoje é da tecnologia e fica decretado que quem não acompanhar seu ritmo é que nasceu há dez mil anos atrás.
Estudiosos do futuro chamam seu campo de investigação com o termo inglês foresight, que se traduz como prospecção. Não se trata, portanto, de um prolongamento no futuro de tendências passadas, mas uma antecipação para orientar a ação diante de um panorama novo. É um campo de estudos acadêmicos em franca expansão em universidades de ponta.
O Foresight se debruça sobre cenários do tempo futuro e que são definidos como prováveis, possíveis, plausíveis e desejados ou preferidos, com intensidades fraca, média e forte de acontecer, emitindo sinais que podem servir de base para as decisões imediatas do momento presente. Com pontos chave sobre o futuro mais claros, teríamos mais possibilidades de construir a realidade que desejamos.
O futuro projetado pelos pesquisadores de Foresight se distingue da visão sombria e distópica (não utópica) de filmes clássicos de ficção científica. Foresight não compactua com a visão de futuro do planeta mergulhado no esgotamento dos recursos naturais, vítima de sequelas de guerras atômicas, com incremento brutal da desigualdade, dramática degradação ambiental, fome, violência e caos. Sem falar na presença ambivalente de androides ou seres híbridos de humanos com robôs ameaçadores e traiçoeiros, empoderados pela Inteligência Artificial.
O fenômeno da Inteligência Artificial consiste ainda na maior incerteza em relação ao futuro. Antigos fantasmas rondam mesmo os mais aficionados utopistas e instigam medo de que seremos reféns dos avanços e do conhecimento humano, que nem sempre seguirá as regras do que queremos. Como será o amanhã se estas máquinas foram livres e autônomas?
Aliás, completou 50 anos a primeira Inteligência Artificial a sabotar seus programadores e a assassinar pessoas: Hal 9000, um computador central que a tudo via e a tudo controlava no livro do escritor britânico Arthur Clarke “2001 – uma odisseia no espaço”, filme e obra prima de S. Kubrick.
O físico Sthepen Hawkings, famoso homem de ciência que sobreviveu à gravíssima enfermidade neurológica, teve sua imagem corporal fundida a uma cadeira de rodas especial, feita sob medida, e ela, por sua vez, foi inteiramente conectada a equipamentos de Inteligência Artificial. Hawkings encarnou o maior dos paradoxos quando acionou veementemente o sinal vermelho em relação à Inteligência Artificial. Logo ele que se manteve conectado ao mundo externo graças à tecnologia inteligente e que pode desenvolver e popularizar suas descobertas inovadoras, levando uma vida produtiva, apesar de suas imensas limitações, logo ele, como pode?
O paradoxo de Hawkings se parece com o nosso: tememos e rejeitamos certa imagem de futuro, mas já estamos fundidos a ele.
Como será o amanhã?
Carlos Linhares
Colunista
Ansiedade, estresse e correria – entre Chronos e Kairós
A experiência da ansiedade só é “divertidamente” nos filmes da Disney. Na vida real, cobra um pedágio altíssimo e requer maturidade emocional e resiliência. É sintomático que a animação “Divertidamente 2”, do estudio Pixar, tenha atingido um estrondoso êxito e muitos...
Consumo insustentável na sociedade do excesso
Recentemente, fui convidado pelo Instituto Multiversidad Popular, em Posadas, na capital da Província de Missiones, na Argentina, para falar para os alunos de curso de pós-graduação. A missão da “Multi”, como a instituição é carinhosamente conhecida, é difundir...
A potência oculta dos ritos de passagem
Vocês já repararam quantos ritos celebramos nos meses do verão? A temporada começa antes do Natal. Sagrados ou profanos, eles estão presentes nas tradicionais confraternizações que demarcam o fim do ano laboral, com os lúdicos “amigos-secretos”, típicos ritos “de...
Priorizar a saúde mental
Foi há uns tantos anos atrás, eu atuava em um RH do Polo Petroquímico de Camaçari, foi quando escutei um operário chamar um colega de chão de fábrica, de Tarja Preta. Rodrigo era seu nome e ele havia usado antidepressivos ao longo de um período da doença. O bastante...
Não aperte a minha mente: saúde mental em tempo de urgência
O tempo está passando muito veloz, a velocidade é o novo valor, virou uma commodity, a regra do quanto mais rápido melhor se consolidou. Não apenas comemos fast food, como também escutamos música e recados no WhatsApp de forma acelerada. E há quem assista filmes em...
Economia da Atenção: como o universo das telas deteriora nossa saúde mental
Repare que a dama do meme que ilustra este texto mal consegue sustentar os coraçõezinhos vermelhos. A Deusa dos likes e das curtidas expressa contentamento e ar de triunfo, afinal recebeu o reconhecimento esperado e capturou a atenção de quem a curtiu. Ela não faz...
junte-se ao mercado