Entrevista: Jacqueline Bastos – Fundadora da Abebé Cosméticos
“A partir do nosso amadurecimento, desenvolvemos estratégias para alcançar nossos objetivos voltados às comunidades, fortalecendo economicamente e culturalmente as comunidades de matriz africana. ”
Engenheira química, Jacqueline Bastos é a fundadora da Abebé Cosméticos, um negócio social que se conecta ao povo preto e suas raízes, unindo religião, natureza e história e causando, à primeira vista, identificação. Em 2016 iniciou-se ao candomblé, sendo o ingrediente que faltava para entender a potência destes três elementos integrados e criar algo único, com sua identidade e propósito.
O negócio, que traz consigo ainda uma função social, surgiu a partir de uma inquietação vivida por ela, causada pela falta de cosméticos para negras e negros. Seu objetivo com a Abebé é levar o olhar de autocuidado para o mundo, empoderando e inspirando outras mulheres, principalmente pretas, a acreditarem em si e no seu potencial.
ABMP: A produção artesanal de cosméticos e outros produtos veganos vem crescendo de forma acentuada no Brasil e no mundo. De acordo com o Ibope Inteligência, aproximadamente 14% da população brasileira afirma ser vegana, um aumento de 75% em comparação a 2012. No seu caso, empreender neste ramo foi influenciado por esta tendência sustentável?
JB: Na realidade os números e tendências de mercado são guias estratégicos importantes nas tomadas de decisões, mas, para mim, antes disso, trabalhar com cosméticos naturais e veganos é uma forma de mostrar como a comunidade de matriz africana tem a natureza como centro, e que a relação com os ingredientes naturais, como ervas e folhas, já era utilizada antes mesmo da gente entender essas práticas como autocuidado. Portanto, essa é a nossa maior influência.
ABMP: Como a identidade da Abebé foi construída? De que forma esta comercialização dos produtos naturais e veganos dialoga com o candomblé e o movimento antirracista?
JB: Veio dos nãos, a partir de experiências negativas. Da falta de representatividade do mercado cosmético, de como o mercado enxergava uma mãe, e de como a intolerância religiosa estava presente em Salvador. Essas insatisfações foram responsáveis por criar a identidade da Abebé, uma marca representativa e livre de padrões.
A partir do nosso amadurecimento, desenvolvemos estratégias para alcançar nossos objetivos voltados às comunidades, fortalecendo economicamente e culturalmente as comunidades de matriz africana.
ABMP: Empreender no Brasil tem obstáculos peculiares. Com pandemia e crise econômica, então, ter que “dar seus pulos” tem sido muito mais comum. Quais são os principais desafios para botar os produtos na rua e na mão do cliente?
JB: Empreender no Brasil é desafiador, uma verdadeira roda gigante. E a gente fica muito mais tempo na parte de cima do que com os pés no chão. Hoje, nosso principal desafio é a visibilidade, tornar nossa marca conhecida, e fazer com que a comunidade e população como um todo entendam nosso propósito. Tudo isso para, a partir daí, gerar mais vendas.
ABMP: O candomblé e a sustentabilidade têm um ponto de encontro que é o aspecto social, o que você demonstrou idealizando a campanha “Terreiros Contra a Covid” no início da pandemia, que buscou distribuir cerca de 5 mil sabonetes e capacitar profissionalmente 30 mulheres, num curso de saboaria natural. De onde veio e até onde foi este projeto? Vem mais por aí?
JB: Esse projeto foi uma alternativa que encontramos para impactar positivamente as comunidades de terreiro. Foi incrível essa movimentação e o resultado. No pós pandemia, temos planos traçados para nos aproximar da comunidade novamente.
Temos o objetivo de desenvolver oficinas, resgatar histórias e nos fortalecer. Neste mês de junho vamos iniciar o cadastramento de consultores da Abebé para os terreiros, pois o nosso objetivo é ter um em cada casa. Os selecionados vão receber catálogo, amostras, ecobags e treinamento profissional para que, de fato, possam desenvolver uma renda e, juntos, mudar o cenário.
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