Entrevista: Jéssica Senra – Apresentadora do Jornal Bahia no AR (Record TV Itapoan)
” Acho que depende muito de nós [mulheres], de lutarmos por isso. Não vejo ninguém entregando condições justas nem nos valorizando de graça. Temos que batalhar mesmo, provar nosso valor. Temos que ser duas, três vezes melhores que os homens para termos espaço.”
Jessica Senra é jornalista, apresentadora do Bahia no Ar, programa líder de audiência há mais de 2 anos, eleito melhor telejornal local do Brasil duas vezes consecutivas pelo site NaTelinha, do Uol. Nascida em Salvador, é também Master em Jornalismo pela Universidade de Barcelona / Columbia University. Começou a carreira jornalística na Rádio Metrópole, passou pela TV Band e, há 7 anos, está na Record TV Itapoan onde apresenta o telejornal diário. Nesta função, já ganhou prêmio de profissional de Imprensa da ABMP e foi eleita melhor apresentadora de telejornal local do Brasil no ano passado. Um dos marcos na sua trajetória foi em 2015, quando houve a tragédia do Barro Branco (deslizamento de terra com vítimas fatais), em Salvador, e ela deixou o estúdio para transmitir todo o jornal direto do local, feito inédito na Bahia. Entre uma notícia e outra, medita e faz artesanato.
ABMP: Todos nós conhecemos a jornalista Jéssica Senra, que está à frente de um programa de sucesso nas manhãs da TV. Vamos começar essa entrevista com uma curiosidade: você sempre quis trabalhar com comunicação e com TV? Foi daqueles sonhos de criança?
J.S: Não, não era um sonho de infância. Quando criança, queria ser advogada. Mais tarde, cheguei a fazer vestibular para Medicina. Mas o Jornalismo te escolhe, é inevitável! Em todas as três profissões que citei, meu objetivo era ajudar as pessoas, era trabalhar com algo que fizesse a diferença no meu entorno. Hoje vejo que a comunicação é uma boa maneira de provocar mudanças e percebo que ela sempre fez parte da minha vida, é a minha missão mesmo. Mas tem uma coisa curiosa sobre minha relação com a TV. Eu nasci na Federação, bairro onde estão todas as emissoras. Me lembro de muitas vezes estar no ponto, esperando o ônibus, e ver passar os carros das emissoras e pensar em como seria trabalhar na TV; imaginava que um repórter poderia parar ali para me entrevistar ou algo do tipo. Sonhos infantis que acabaram virando realidade.
ABMP: O mês de março é dedicado as mulheres, em virtude do dia 08, que celebra o Dia Internacional da Mulher. Especialmente na comunicação, na sua opinião há um reconhecimento ou valorização da mulher? Acha que mais oportunidades e condições salarias dignas estão sendo ofertadas na área ou ainda existe uma disparidade em relação aos homens?
J.S: Sem dúvidas, ainda existe grande disparidade. Ninguém gosta de falar sobre o salário que ganha, mas veja as especulações de valores de jornalistas nacionais, por exemplo. Homens sempre têm salários maiores, mesmo em posições semelhantes, mesmo com resultados semelhantes. Ainda existem mais homens do que mulheres em posições de chefia. Mas acho que as mulheres aos poucos vão ganhando espaço. No meu caso, por exemplo, hoje apresento um programa popular líder de audiência. Esse tipo de programa sempre foi território masculino, mas hoje já há mulheres fazendo. E fazendo bem. Acho que depende muito de nós, de lutarmos por isso. Não vejo ninguém entregando condições justas nem nos valorizando de graça. Temos que batalhar mesmo, provar nosso valor. Temos que ser duas, três vezes melhores que os homens para termos espaço. E, ainda assim, sofremos certo preconceito. Ainda nos olham com menos respeito. A ideia de superioridade do homem sobre a mulher ainda está muito arraigada na nossa sociedade. É um discurso muito repetido em esferas de poder, como Igrejas, a própria Mídia, o Estado. Na TV, por exemplo, a mulher ainda é muito objetificada, ou seja, o papel que gostam de nos dar é o de objeto belo para ser apreciado. E muitas mulheres ainda se sujeitam a isso e até acreditam que esta é a única coisa que têm a oferecer. Então, quando historicamente a mulher é tida apenas como um objeto para ser visto e usado, quando ela quer falar e mostrar que também tem cérebro, talentos e potencialidades, isso ainda é visto com certa resistência.
ABMP: Você já enfrentou alguma dificuldade no jornalismo por ser mulher? Em algum momento sentiu ser subestimada por esse aspecto? Se sim, como contornou a situação?
J.S: Sim. Já sofri assédio, por exemplo, num local de trabalho. Na época, eu não enxergava como assédio. Era feito em tom de brincadeira pelo chefe. Ele tinha fama de conquistador e fazia brincadeiras de cunho sexual e até passava a mão nas mulheres com quem trabalhava. Era uma pessoa muito agradável, todas adorávamos ele e talvez por isso muitas tolerassem. Era aquela coisa feita como brincadeira, mas uma brincadeira sexual e invasiva. Eu nunca me senti confortável e deixei isso claro para ele desde o início. E ele me respeitou. Fazia as brincadeiras com as demais, mas evitava fazer comigo. Ele passou a me respeitar talvez justamente por eu ter me imposto e mostrado meu valor intelectual e profissional.
Mas este não foi o meu único obstáculo. Quando comecei a fazer jornalismo popular, cheguei a ouvir de um chefe que isso não era coisa para mim. Ele chegou a dizer, inclusive, que eu era muito “bonita” para este tipo de programa, que minha imagem não condizia com o jornalismo popular. Mas eu insisti e provei para ele e para tantos outros que tinham esta mesma ideia que eles estavam errados. Para fazer um bom jornalismo popular, é preciso ser um bom comunicador, estudar e saber se colocar no lugar das pessoas.
Há outros obstáculos que enfrento além desses. Alguns eu tiro de letra. Outros ainda não aprendi a contornar. Eu tenho a sensação de que, se fosse um homem tendo os meus resultados, por exemplo, haveria uma maior valorização. Mas faz parte do processo, não é mesmo? Acho que todas as mulheres enfrentam dificuldades para serem levadas a sério no trabalho.
ABMP: Frequentemente, quando alguns veículos falam sobre seu trabalho há uma referência a sua beleza. Acha que é um traço machista? Isso a incomoda em algum aspecto?
J.S: Sim, me incomoda. Não sou hipócrita: a beleza me ajudou a entrar na televisão. Ainda existe uma exigência estética para estar nesse meio, principalmente para mulheres. E acho que a beleza ajuda a atrair atenção mesmo. Mas chega um momento em que há uma resistência para enxergar além disso. Como as mulheres costumam ocupar espaços na TV apenas por serem bonitas, às vezes é difícil que te levem a sério. Se somos apenas corpos, beleza, algo tão superficial, por que alguém prestaria atenção no que estamos dizendo? Se o papel de falar sempre foi dos homens, por que ouviríamos uma mulher? Além disso, ainda existe um estigma de que mulher bonita é burra. Então é preciso batalhar muito para que te reconheçam além do seu corpo, além da sua beleza. Não digo isso com vitimismo. É apenas uma constatação. Passados alguns anos, acho que já consegui mostrar que não estou na TV pelos meus belos olhos, sou líder de audiência há mais de dois anos porque sou uma profissional muito dedicada, apaixonada pelo que faço, corajosa para dizer o que penso e para defender o que acredito, com vontade de ser melhor a cada dia. A comunicação é a minha missão e lutarei quantas batalhas forem necessárias para provar o meu valor e para servir ao meu público.
ABMP: O Bahia no Ar, apresentado por você, atinge a liderança da audiência no horário com certa frequência há alguns anos. A que você atribui o grande sucesso do telejornal?
J.S: Olha, a audiência é sempre resultado de muitos fatores. Se hoje somos o matinal local de maior audiência do Brasil, isso é resultado de uma construção. Houve investimentos significativos da Record TV Itapoan em tecnologia e em grandes profissionais. Tenho uma equipe fantástica, dedicada a fazer o melhor jornal possível. Este sempre foi o nosso maior propósito. Nunca pensamos em buscar a audiência simplesmente. Porque a audiência pode ser conquistada de diversas formas, inclusive sem qualidade. Eu, particularmente, sempre quis fazer um jornal do qual tivesse orgulho. E construímos o Bahia no Ar reunindo o melhor do jornalismo tradicional – a preocupação com a qualidade, conteúdo e a ética – com o que o jornalismo popular tem de melhor – uma comunicação mais leve e fluida, opinião embasada e sem demagogia. Agradeço demais à Record pela liberdade que sempre me deu para falar de qualquer assunto, para fazer o Bahia no Ar do meu jeito, com a minha cara. E minha felicidade maior é ver que esse formato agradou e continua agradando a muita gente! Seguimos nos aprimorando, porque nossa sociedade está em constante transformação. E assim também estamos nós, sempre acompanhando e refletindo essas mudanças.
ABMP: No telejornalismo baiano há inúmeras matérias com apelo popular, de olho na audiência. O Bahia no Ar consegue um formato diversificado, popular, porém, com matérias de serviço, opiniões, interesse público, e a audiência responde muito bem. É difícil manter o programa dessa forma? Qual tem sido o feedback do público quando encontra com você na rua?
J.S: Construir este formato não foi fácil e mantê-lo é, sim, um desafio. Quando cheguei na Record, o foco do jornalismo local era muito policial. Ainda temos bastante espaço para as matérias de polícia, afinal de contas vivemos um momento de muita criminalidade. Mas há muitos outros assuntos que interessam e precisam ser falados. Tem muita gente que acha que jornalismo popular é só falar de crimes e de problemas das comunidades carentes. É preciso enxergar além. Parar com esse olhar de fora, sabe? Estar atento ao nosso redor e ao que importa às pessoas. Há muita carência de informação de tudo! De saúde, de direitos, de como as coisas funcionam… E de formação de opinião mesmo! Então acho que o segredo é essa dedicação diária, é estar atento a tudo o que está ao nosso redor, o que vemos nas ruas, o que se conversa nas rodas de amigos, o que chega de demanda… E, para o apresentador de programa popular que se propõe a comentar, a se posicionar, é necessário estar constantemente estudando, lendo, se informando, formando sua própria opinião para poder dividi-la com os demais. Não dá para ir para a frente da TV e dizer o óbvio. O público quer mesmo que você traga um viés novo, que o faça refletir. Este é o feedback que eu recebo das ruas. Por um lado, muita gente me agradece por ter a coragem de dizer o que muitos não dizem e o que muitos não tem a oportunidade de dizer, ser a voz dos menos favorecidos mesmo. Por outro, sinto que a gente desperta quem nos assiste para temas e visões diferenciadas. Isso faz pensar, refletir, crescer. Muitos podem até não concordar com o que digo. Mas até o ato de discordar nos ajuda a ampliar nossa visão.
ABMP: Para finalizar: você tem algum hobby, alguma coisa que gosta de fazer por prazer, e que nada tem a ver com seu trabalho na televisão?
J.S: Sim, alguns. Sou uma leitora compulsiva, pratico diariamente a meditação e passo boa parte do meu tempo livre com uma paixão que descobri recentemente: a joalheria. Fiz um curso de Design de Jóias durante umas férias em Barcelona e me apaixonei. Há um ano, montei um atelier em casa e produzo anéis, brincos, pingentes e tudo o que vier à mente. É um momento quase terapêutico, em que utilizo as mãos para me comunicar através das formas do metal. Por enquanto, produzo peças apenas para mim mesma e para presentear amigos. Perco a noção do tempo quando estou lá!
Foto (01): Divulgação
Foto (02, 03, 04): Acervo Pessoal
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