Entrevista: Sérgio All – Co-founder Conta Black

nov/2022

Tudo o que eu sou hoje e tudo que construí até hoje é porque sempre acreditei na minha capacidade de entrega e, montar um banco é só a ponta do iceberg.                                

                                                                                                                                                                        

 

 

Conheça o afroempreendedor que está mudando a realidade financeira dos brasileiros

 

Sérgio All é um homem preto que tinha um sonho: ser empresário. Hoje, ele transformou seu sonho em realidade e desde então têm transformado a sua própria realidade e a realidade financeira de muitas outras pessoas.

Saiba mais sobre a trajetória do fundador da Conta Black, um banco digital focado em pessoas pretas que tem a missão de viabilizar sonhos e potencializar negócios.

 

 

ABMP: Para quem o acompanha é muito fácil se identificar com o empresário negro oriundo da periferia de São Paulo, que já foi office boy, atuou nos segmentos de jogos, é publicitário e atualmente é fundador da Conta Black. Para quem não conhece Sérgio All, o que significa toda essa trajetória?

SA: Essa trajetória tem vários significados importantes para mim. E tem muito a ver com a minha criação. A gente sabe que grande parte do nosso público é preto e periférico, vive nas comunidades do país e nem todos tem uma família bem estruturada, um pai ou uma mãe para alimentar seus sonhos.

Uma pergunta que sempre faço nos eventos é: o que você quer ser quando crescer? E uma coisa que eu falava para minha mãe quando via tanta dificuldade é que eu queria ser um empresário para realizar o sonho dela e dos meus irmãos, dar uma vida digna para minha família. E ela foi uma das pessoas que sempre me incentivaram desde pequeno a ser o que eu quiser. Esse aqui é um ponto importante para traduzir tudo o que sou hoje e o que fui construindo ao longo da minha jornada.

Fui intraempreendedor porque eu precisava ter o conhecimento mínimo e básico de como se trabalha em uma grande empresa. E como se entende gestão e depois que entendi que aquele mundo não era pra mim, resolvi empreender. Eu percebi que aquele conhecimento básico que eu tive era o suficiente para construir essa narrativa de ser um empreendedor em uma época que não tinha tecnologia. Isso me gerou uma experiência e me preparou para o mundo.

Depois, quando resolvi empreender na área de tecnologia quando a internet ainda era uma simples bolha, pude provar para o mercado que pelas experiências que construí, eu poderia ser um empresário do ramo da tecnologia e provei isso ao ser o primeiro jovem preto a vender uma empresa no final da década de 90 e usar esse mesmo recurso para ser publicitário sem ter formação em publicidade. E isso porque minha mãe sempre falou que eu posso ser o que eu quiser. Eu me tornei um jovem publicitário de sucesso porque eu fui aprendendo com o mercado como se desenvolve estratégias de comunicação e como se constrói relações dentro de um mercado que é dominado por pessoas brancas e, eu permaneci neste segmento durante 20 anos.

Tudo o que eu sou hoje e tudo que construí até hoje é porque sempre acreditei na minha capacidade de entrega e, montar um banco é só a ponta do iceberg. Usei uma dor e uma negativa para montar um negócio que eu me propus a fazer. Acredito que toda essa jornada, toda essa construção vem da minha criação e eu sempre falo para todas as pessoas que sonhar é possível e, que realizar também desde que você estude, que você se capacite e se conecte com as pessoas certas que te conduzam ao seu objetivo.

 

ABMP: Ao contar sua história, você sempre frisa a irritação que teve ao tentar solicitar um empréstimo que seria utilizado na atualização dos equipamentos da sua agência e você sabia que o racismo se fazia imperar naquele momento. Tal negativa te fez estudar o mercado financeiro e se articular durante anos para criar o banco digital Conta Black. Como você acha que a sua experiência e o seu banco podem mudar a perspectiva da população negra sobre o acesso a investimento no nosso país?

SA: Existe um ditado que as pessoas falam que é o não ele existe, mas muitas pessoas param nesse não e eu sempre entendi que o não é casado com o sim.

Eu senti a dor do racismo quando o gerente do meu banco, no qual eu tive conta há mais de 15 anos, falar que eu não teria acesso ao crédito por causa da minha cor, isso é um fato já que eu tinha um crédito aprovado. Eu falei que eu precisava achar o sim e eu sempre corri atrás do sim. É tanto que eu tenho uma palestra “Transformando nãos em sim” onde eu reflito sobre quantos não’s eu transformei em sim’s. E quando eu trago essa narrativa, do ponto de vista de todo afroempreendedor, seja ele periférico ou não, é que existe dentro de uma jornada muito individual nossa que é não desistir dos nossos objetivos de vida e muitos de nós desistem. E quando eu compartilho essa narrativa mostra que é possível qualquer pessoa atingir a realização de um sonho quando ela está obstinada a correr atrás desse objetivo.

Eu poderia ter desistido de muitas coisas. Eu fui dono de uma empresa de games em uma época em que o Brasil era campeão em pirataria. Eu resolvi montar uma agência de comunicação que virou Full Service e sobreviveu durante 20 anos de mercado. E quando resolvi montar um banco, muitos disseram que eu não conseguiria porque é um mercado muito fechado e, hoje, estou aqui falando como um banqueiro.

Então, o papel da Conta Black também vem com esse objetivo, também de educar o mercado corporativo e mostrar que nós não somos apenas um banco, somos um negócio feito de pessoas, para pessoas.

 

ABMP: Existe uma soma de forças perceptível em cada uma das suas falas sobre o que te move ao empreender e seguir com convicção para novos caminhos. O que mais chama atenção é que sua mãe sempre está em foco em todos os seus passos, como isso se conecta com a sua atuação e relacionamentos?

SA: O papel da minha mãe foi muito importante porque dizem que o jovem forma a sua personalidade a partir dos sete anos.

Imagina, jovem preto, terceiro irmão de seis irmãos, morando na periferia, um pai metalúrgico que trabalhava até tarde, uma mãe que era empregada doméstica, às vezes lavadeira, que também dava vida para nos alimentar e eu sentia toda aquela dificuldade. Foi neste momento que nasceu o Sérgio empreendedor, sabe?

Então, ela foi a pessoa que sempre me incentivou a trilhar esse caminho, desde pequeno e ela me deu cinco passos para seguir quando eu era pequeno.

Primeiro, numa época em que não tinha muita tecnologia, ela falava que a vestimenta era importante porque eu poderia ser um corpo preto facilmente confundido nas ruas.

Segundo, como naquela época não tinha internet e essas coisas, ela falava que eu tinha que ser um jovem culto, saber sobre economia, saber tudo que acontece ao meu redor no mundo para ser um jovem interessante e isso me destacar perante os outros.

Terceiro, ela falava para zelar pelo meu nome, pois naquela época havia um ditado popular:  o nome é seu bem mais valioso e um dia você vai precisar.

E, quarto, ela falava que eu poderia ser o que eu quiser, mas eu teria que provar a minha capacidade de entrega para que as pessoas não questionassem a minha cor.

Então, quando eu vejo isso, eu vejo o quão importante foi o papel dela na construção da resiliência e da crença que eu posso e que ninguém vai me impedir. Então, ela tem um papel muito importante até hoje.

Eu sempre cito ela porque eu falo que o papel da família tem um papel muito forte na minha formação empreendedora. Quando você não tem um pai ou mãe, alguém que te incentive, os mentores fazem esse papel do pai, de te aconselhar a seguir os melhores caminhos, de fazer as melhores conexões, de ser o seu escudo quando você precisar de defesa.

E é isso que eu faço com muitos jovens, muitos empreendedores, até não tão jovens assim. É por isso que dedico parte do meu tempo, para mentorar e servir como um guia para ajudá-los a enfrentar esse mundo empreendedor. 

ABMP: Quer dizer que sua mãe é o seu modelo de mentoria?

SA: Exatamente. É por isso que hoje eu vejo a mentoria como algo que faz parte da minha jornada por mais de 30 pessoas que eu mentoro.

 

ABMP: Como empresário você sempre esteve preocupado com letramento racial, ao transitar em segmentos distintos o que você enxerga de diferente quando pessoas negras acessam e participam dos projetos?

SA: Pois bem, eu ainda acho que esse tema ainda está em voga. E, as empresas ainda estão engatinhando quando se trata de letramento racial.

Mas uma coisa que eu sempre fiz nas minhas empresas é sempre assumir uma postura, um posicionamento de entender as dificuldades da nossa comunidade e de abrir oportunidades para o desenvolvimento de grande parte do nosso público, principalmente preto e periférico.

E quando você faz isso, você tira da sua frente o que seria mais importante, que é o produto que a sua empresa oferece e que você inverte isso para o relacionamento das pessoas, de gente. E, isso eu aprendi no mercado publicitário.

Então, eu acho que promover a acessibilidade é algo que eu tenho aplicado muito nos meus negócios desde o começo até hoje, principalmente na Conta Black. O fato de eu criar uma vertical que forma profissionais do mercado financeiro cumpre com um dos meus objetivos e, no próximo ano spoiler: vamos lançar a Black X. A nossa vertical de investimento e o meu maior objetivo é formar até o primeiro trimestre do ano que vem 50 agentes autônomos pretos e mulheres pretas do mercado financeiro.

E eu vou bancar essa formação e transformá-los também em agentes de educação financeira para eles fazerem o impacto no entorno deles.

 

ABMP: O Brasil hoje é um país com cerca de 67 milhões de pessoas inadimplentes. Este número reflete o quanto é necessário investir em educação financeira para transformar essa realidade. Você pode dividir com a gente a sua visão sobre o tema?

SA: A educação financeira também faz parte de você preparar as futuras gerações, entender o valor do recurso financeiro, como se constrói isso, pensando em legado.

Eu acho que ao contrário do que muitos dizem, o brasileiro não nasceu em uma encrenca financeira, eu acho que não.

Eu acho que isso se perdeu com o tempo, porque eu sou de uma época em que quando uma criança nascia tinha uma conta poupança e só podia sacar o dinheiro quando completava a maioridade. E eu tinha a responsabilidade do meu dinheiro de colocar todo mês ali.

Então, pensando nisso, minha missão é trazer a educação financeira como uma ferramenta de inclusão, ela precisa fazer parte do dia a dia do empreendedor. E quando se trata de uma empresa que traz um serviço financeiro como Conta Black, a educação financeira não é somente sobre você poupar dinheiro para ter seu primeiro milhão, mas assim como você se formalizar seu pequeno negócio de verdade, de você ter acesso a ferramentas, produtos digitais como marketing digital, contabilidade, para que a pessoa possa ter uma noção do mínimo do seu pequeno empreendimento. E de como propagar o seu pequeno empreendimento para gerar retorno financeiro.

Então, para nós, a educação financeira vai muito além daquilo que o mercado fala, de ser acolhedor, de ajudar uma pessoa a abrir uma conta, de assinar, de ajudar essa pessoa a se qualificar. É mostrar o caminho certo e construir uma geração empreendedora responsável financeiramente.

 

ABMP: Por fim, como você definiria o objetivo da Conta Black?

SA: Então, o papel da Conta Black é ser mais do que um banco, é também educar o mercado corporativo e mostrar que nós não somos apenas uma instituição financeira, somos um negócio feito de pessoas, para pessoas.

Lidamos com desafios que vão muito além da realidade de ser um banco. E, não, não queremos ter mais de 40 milhões de contas, queremos um milhão de pessoas satisfeitas e que elas sejam minha propaganda de que, sim, elas tem uma experiência notável que vai de A a Z e que realmente impacta a vida delas.

 

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